Apresentação dos pesquisadores Elisa Ramalho Ortigão e José Otavio Lobo Name, que coordenam o projeto de pesquisa Identificação e Registro do Congo do Espírito Santo como Patrimônio Cultural Imaterial Nacional (Patrimonialização do congo do ES), no seminário Avanços e desafios na política do Patrimônio Imaterial, realizado pelo IPHAN-ES, no dia 16 de agosto, na UFES.
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O projeto Patrimonialização do Congo do ES dá continuidade aos projetos “Saberes do Congo, saberes da Universidade”, da Prof.ª Elisa Ramalho Ortigão, e “O Congueiro“, do Prof. José Otavio Name, do Centro de Artes. A prof.;ª Elisa Ramalho Ortigão finalizou uma pesquisa DCR com financiamento da FAPES, Saberes do Congo Saberes da Universidade, que faz uma aproximação dos conceitos de Arte de Walter Benjamin com o congo. Este trabalho também foi o seu pós-doutoramento no Programa de Pós Graduação em Artes da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), no qual organizou os Colóquios sobre o congo do ES, entre 2016 e 2018, visando dar voz, no espaço acadêmico, para que mestres, rainhas e membros de bandas de congo pudessem compartilhar o seu saber. O prof. José Otavio Name é doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal Fluminense e professor de Fotografia, Vídeo e Antropologia Visual do Departamento de Desenho Industrial da UFES. Desde 2014 realiza pesquisa audiovisual sobre o congo, que rendeu o canal O Congueiro do YouTube. Seu documentário “O que é meu vem a mim”(2106), 24 min.) foi selecionado para a Mostra Competitiva do 7º Festival Internacional do Filme Etnográfico do Recife, em 2016.
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O objetivo principal é realizar a identificação do congo do ES e de seus bens culturais associados, de modo a produzir o dossiê de candidatura do congo do ES ao registro como PCI, dando continuidade ao processo aberto pelo IPHAN.
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Em nossos trabalhos, adotamos uma abordagem etnográfica, de interlocução com os detentores do bem, partindo do princípio da autorreferência: entender como as pessoas se veem, e como entendem o congo. Os pesquisadores participam ativamente de atividades relativas ao congo desde 2014, tendo viajado duas vezes à Aparecida do Norte, SP, para a Festa de São Benedito, com a Banda de Congo Amores da Lua, de Santa Martha, Vitória. Tomamos a expressão cultural como articulação de encontros e confrontos, através de formas e performances; por isso, nos interessa como cada banda de congo se relaciona com a comunidade, e com os poderes.
Para a pesquisa, desenvolvemos uma metodologia para o trabalho de campo a partir de três eixos, projetando, ao mesmo tempo, a construção do acervo audiovisual. As entrevistas têm a forma de conversas guiadas e, junto com as gravações das festas e demais celebrações, alimentam a formação de um acervo audiovisual.
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A ideia por detrás da adoção dos eixos como linhas da pesquisa tem motivações conceituais e práticas. Metodologicamente, busca criar recortes na variada gama de informações que podem ser compiladas em entrevistas e visitas, sem se render à rigidez de questionários e tabelas. E, pensados deste o início como elementos de ações de salvaguarda, espera-se que cada experiência de narrativa, de trajetória, seja desenvolvida nos grupos por meio de projetos de apoio e salvaguarda.
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Eixos de pesquisa levam também às questões da salvaguarda.
O eixo memória pode abarcar o registro das toadas e as suas variações. O registro do saber dos mais velhos, as histórias das bandas e de suas famílias.
No eixo local, a necessidade de transporte para as festas e encontros. As festa tem um papel central na prática do congo.
Como problema relativo ao associativismo, temos o custo anual para manutenção do CNPJ. E, também, editais que são feitos para produtores culturais experientes. Exigem dos mestres uma inscrição como produtor cultural. Este é uma das abordagens pensadas em termos de educação patrimonial, um desafio para esta nova relação social do congo como patrimônio imaterial.
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Toda vez que visita uma localidade, a equipe do projeto leva um bolo para a reunião, como forma de agradecimento pela participação, e de celebração pelo encontro. Algumas vezes, a comunidade já nos esperava com um lanche. As visitas, que são ora individuais, ora coletivas, iniciam com o esclarecimento, da parte dos pesquisadores, do que é o processo de patrimonialização; como este, em especial, foi concebido; quais serão as consequências da inscrição do congo capixaba como Patrimônio Cultural Imaterial Nacional, e quem é a equipe, e como pretendemos trabalhar com eles. A partir daí, e dependendo do contexto, a conversa é direcionada para a trajetória da pessoa, ou da família; ou a história da banda, da comunidade, do lugar; ou a visita a locais de reunião, devoção ou de exposição da banda. As entrevistas iniciam com apresentações gerais, seguidas do pedido de concordância com a gravação audiovisual, e logo passa-se à orientação dos entrevistados, a partir das cartelas. Nesses encontros damos prioridade a gravações em áudio, somente, pois o equipamento é menos intrusivo, e não exige quase nenhuma intervenção durante a conversa. Quase sempre, são captadas, também, imagens em fotografia ou vídeo, sem, no entanto, atrapalhar a entrevista.
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Para guiar a etapa de orientação dos entrevistados quanto ao trabalho que está sendo realizado, elaboramos quatro cartelas, impressas em formatos A4 e A3 e plastificadas, como apresentação de apoio visual aos tópicos abordados. Esta apresentação dispensa projetor ou outro equipamento, dando mais agilidade no encaminhamento das discussões, já que o interesse das reuniões está em ouvir os detentores dos bens culturais.
As cartelas servem de guia para que as bandas recebam a mesma orientação, mantendo um clima descontraído de conversa. O manuseio das cartelas pelos participantes das reuniões favorecem a interação, estimulando visualmente as discussões.
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As gravações de cada entrevista são, em seguida, decupadas, de modo que se possa encontrar, a qualquer momento, um determinado trecho da conversa; e transcritasintegralmente. A partir das entrevistas, algumas informações alimentam um banco de dados, desenvolvido pelo bolsista de pesquisa João Victor Penha dos Santos, de Ciências Sociais, com o fichamento dividido entre pessoas, bandas e lugares, com indexação dos termos. A ideia é ter uma base de dados compartilhada com conguistas, pesquisadores e a sociedade em geral.
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Resultados parciais acerca da metodologia mostram que o processo está contribuindo para que consigamos atingir os objetivos do projeto. Os temas propostos pelos eixos favorecem a identificação de problemáticas. Assim conseguimos encontrar e perceber novos pontos de vista, problematizando os discursos.
As reuniões e entrevistas têm sido oportunidade de expressão, de troca. A ideia da patrimonialização foi aceita por todos, até agora.
O trabalho estabelece um recorte temporal de registros do congo com uma amplitude ainda inédita. Neste trabalho encontramos uma banda recém fundada, A Banda de Congo Zumbi dos Palmares, e uma que estava adormecida, a Banda de Congo de Santa Rosa.
Já registramos as Bandas mais distantes, ao norte do rio Doce e ao sul, em Guarapari. Deixamos para o fim as bandas mais próximas e mais conhecidas pela equipe, como a Serra, Vitória e Barra do Jucu. Até agora não conseguimos contatar duas bandas, que, infelizmente, desconfiamos não existirem mais.
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Os conguistas demonstram consciência do valor social do que fazem, em concepções correlatas aos conceitos patrimoniais: pertencimento, identidade, tradição. As bandas realizam suas atividades por meio do trabalho coletivo e da contribuição comunitária – e mesmo as bandas mais institucionalizadas, que têm mais recursos dependem da disposição pessoal de seus membros, que são oriundos das camadas sociais mais subalternas, em termos de renda e educação.
As bandas são, ao mesmo tempo, as guardiãs da tradição e motoras das inovações do congo, e a maioria dos bens associados do congo estão ligados às bandas.
As festas são parte fundamental da expressão, e são o território ampliado dos encontros e confrontos das bandas de congo com as forças e entidades que as cercam.
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O andamento do projeto de pesquisa é registrado no site de O Congueiro, e replicado no blog da página Saberes do Congo, Saberes da Universidade.
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O Projeto de Pesquisa “Identificação e Registro do Congo do Espírito Santo como Patrimônio Cultural Imaterial Nacional” foi criado através de uma parceria, via Termo de Execução Descentralizada, entre o IPHAN-ES e a Universidade Federal do Espírito Santo, com o apoio da FUCAM. Participam do projeto os bolsistas de pesquisa João Victor dos Santos e Daniel Zürcher.
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Publicado por ocongueiro
agosto 19, 2019
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