A pesquisa com vistas à inscrição do congo como patrimônio imaterial nacional foi realizada por meio de parceria entre a Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Espírito Santo (Iphan-ES) e a Universidade Federal do Espírito Santo, através de Termo de Execução Descentralizada assinado em dezembro de 2018. O projeto estipulava a produção do dossiê de inscrição, relatório de pesquisa, e a produção de dois vídeos, com cerca de 50 e 15 minutos, respectivamente.
O vídeo Congo do Espírito Santo: Celebrações e Formas de Expressão (2020, 1080p. 62min.) foi produzido pela equipe a partir das entrevistas e registro das festas. Foram também usadas algumas imagens de depoimentos e de festas de congo produzidas no âmbito dos projetos de pesquisa anteriores dos coordenadores deste estudo.
O roteiro começou a ser elaborado em outubro de 2019, e divide o filme em duas partes. Na primeira, são apresentados os elementos mais sensíveis do congo, que são as festas de mastro. Uma sequência de fincadas de mastro procura mostrar a diversidade dos rituais, e como cada banda desenvolve a sua tradição. Algumas cenas, um pouco mais longas, procuram traduzir, em poucos minutos, momentos que levaram horas para acontecer. São as Celebrações.
Na segunda parte, o filme mostra as Formas de Expressão, por meio de depoimentos e cenas que apresentam saberes, mitos, técnicas e produções artísticas. O preconceito com que o congo á tratado pela sociedade também aparece na fala dos mestres. Aliás, são os mestres e as rainhas que guiam o espectador: esta foi uma opção metodológica da pesquisa que se reflete no filme. Não há narrações em off, letreiros explicativos ou entrevistas com pessoas externas ao congo. As legendas apresentam, em destaque, o nome do entrevistado, na banda de congo, ou da festa em cena, seguidos do local e da data. Os entrevistados têm legendas com seu nome em todas as cenas em que aparecem.
A versão curta-metragem (16 minutos) não traz nenhuma cena adicional, sendo um resumo do vídeo longa-metragem. Tem, devido a sua curta duração, uma estrutura narrativa mais “informativa”, priorizando as entrevistas e abrindo mão das cenas que, no longa-metragem, procuram conferir um experiência temporal aos festejos de congo.
De acordo com o projeto, o roteiro dos vídeos deveria ser construído em diálogo com o Iphan. Assim, foi apresentado, em dezembro de 2019, um primeiro tratamento, com o argumento do filme e as sequências planejadas.
Sequências:
1- O que se faz: o sensível do congo. O ponto culminante das festas é um momento em que o coletivo é também individual, cada um imerso em seu transe. Ao lado das promessas e graças, cada um tenho as suas divindades, as suas devoções, a sua própria religião. O que leva ao 2:
2- Como cada banda, cada congueiro, entende e expressa o congo. O que cada um sente e expressa. O que sustenta o congo são as famílias; o que as sustenta é a promessa e o compromisso. O que é ser mestre, rainha e conguista? Como se faz um mestre? Ninguém é indiferente à música e à dança:
3- Etnomusicologia. Notas sobre música, verso e dança, incluindo as críticas e “implicâncias” que quase todas têm com relação ao jeito de tocar e dançar das outras bandas. Descrições sobre como se faz o congo.
4- As narrativas do congo. Naufrágio. Histórias familiares. Graças e milagres. Destas duas narrativas, suas maneiras de contá-las e as variações, devem sair elementos para uma “realização” final:
5- O que é o congo? Aqui entrariam informações demográficas e geográficas, ao mesmo tempo que as pessoas falam de conceitos mais profundos. Para onde vai? As bandas mirins, os “mestrinhos” e dançarinas do futuro.
O trabalho de captação foi realizado em duas frentes: entrevistas e festas. As entrevistas e depoimentos, que já vinham sendo realizadas no trabalho de campo da pesquisa, seriam retomadas em uma segunda fase de gravações. É que, no trabalho de campo, o mais importante é o estabelecimento do contato pessoal e do diálogo com os conguistas. Por isso, certas questões técnicas, de som e iluminação, não podem ser devidamente resolvidas nestas ocasiões. Narrativamente, a filmagem de entrevistas para uma obra audiovisual é diferente da filmagem com vistas ao registro do trabalho de campo.
As primeiras gravações serviriam de guia para o roteiro de entrevistas a serem realizadas entre março e abril de 2020, já na fase de edição dos filmes. Esta segunda fase de entrevistas teria uma pauta de tópicos mais definida pela equipe, e seriam tomados cuidados especiais com o som e a imagem. Isso não quer dizer que as gravações das entrevistas da pesquisa fossem descuidadas. Quase sempre, foram usadas duas câmeras, e sempre houve a gravação do áudio em separado. Em alguns lugares, e quando só havia um entrevistado (Mestre ou Rainha, ou artesão, por exemplo), foi possível fazer entrevistas com as características de gravação voltadas para o filme. As medidas de isolamento social para a contenção da pandemia de COVID-19, no entanto, impediram a realização da segunda fase de entrevistas, específicas para o filme, e por isso as entrevistas coletadas na primeira fase da pesquisa acabaram incorporadas à edição do vídeo.
Fotografia e color grading
Foram usados os seguintes equipamentos para a captação das imagens do filme: câmeras Canon EOS 550D e T4i, com objetivas Canon 17-35mm 1:2.8 L, 20mm 1:2.8, e 18-135mm 1:3.5-5.6 STM; câmera Sony HXR-NX100 com lente 9.3-111.6mm 1:2.8. As câmeras DSLR Canon têm sensor de imagem formato APS-C, semelhante ao formato de cinema Super-35. As imagens, gravadas em perfil de imagem Technicolor Cinestyle, têm boa latitude de exposição e permitem um trabalho mais refinado de color grading. A câmera Sony tem sensor de 1″, formato considerado grande, dentre as câmeras der vídeo, sendo um pouco maior que o frame de filme 16mm de cinema. O perfil de imagem usado na câmera Sony foi customizado pela equipe, e tem características de contraste e saturação semelhantes ao das câmeras Canon, permitindo uniformidade entre as imagens de diferentes câmeras.
Algumas entrevistas puderam ter o setup adequado à captação de imagens para o vídeo final, e então a composição e a iluminação puderam ser estabelecidas segundo a direção de fotografia. Mas, mesmo nas condições em que a prioridade era a conversa, em que era difícil ou impossível controlar os aspectos de som e imagem, os maiores cuidados foram tomados na gravação.
Nas festas de congo, foram usadas as câmeras Canon, que são mais leves e adequadas ao trabalho de acompanhar performaticamente as bandas. Aqui, a experiência de mais de cinco anos à frente do canal O Congueiro no YouTube conferiu segurança e rapidez na tomada de decisões.
Na edição a correção de cor das cenas foi seguida do color grading, ou seja, do tratamento de cor como elemento narrativo. Nesta etapa, além de decisões estéticas, são observados os parâmetros de reprodução de cor padronizados pela norma BT 709, relativa a vídeos em formato e espaço de cor 1080p, ou FullHD. O estilo visual adotado privilegia aspectos que parecem ser importantes nas manifestações do congo: cor, ritmo e movimento. Partimos do princípio que, em documentários, os artifícios de linguagem devem partir das reflexões do diretor acerca do que testemunha, e ser usados como sua expressão.
Áudio e sound design
Um dos aspectos mais importantes observados na produção do filme foi o da captação e da edição do som. O agora antropólogo formado Daniel Zürcher, que foi nosso bolsista do estudo etnomusicológico, é também músico, e atuou em várias gravações como operador de áudio. A seu trabalho se junto o Mestre em Artes e designer Felipe Mattar, que atuou no sound design dos vídeos. Na diversidade de imagens, a trilha sonora é o fio condutor de grande parte da narrativa.
Além dos microfones das câmeras (um shotgun e um estéreo), foi usado, também, um gravador de áudio Zoom H4n, de quatro canais, com gravações de 24 bits de 48.000kHz.
O trabalho de sound design é uma etapa importante da finalização do filme, e por isso havia sido planejada desde a elaboração do projeto para o aditivo para as tarefas audiovisuais. Além de fazer a normalização do áudio e de corrigir problemas de passagem de áudio ou ruídos, o sound design estabelece propriedades espaciais relativas às cenas, gerando trilhas de áudio específicas para os ambientes, as falas e as cenas de congo.
Por fim, os vídeos foram formatados em versões voltadas às diversas formas de exibição: cópia master, para exibição direta, arquivamento e geração de cópias; versão para distribuição em plataformas de streaming, como o YouTube; além da autoração para DVD, com o respectivo menu de navegação. Todas as versões contam com legendas em português, inglês e espanhol. Para o DVD, foram produzidas, também, as artes da capa, da mídia e dos menus.
O dossiê de pesquisa e os vídeos foram submetidos ao Iphan-ES no início de julho de 2020, e serão publicados pelo Instituto no momento oportuno. A versão em DVD será distribuída, prioritariamente, entre as bandas de congo, entidades envolvidas, e algumas bibliotecas e escolas das regiões do congo.
O Projeto de Pesquisa “Identificação e Registro do Congo do Espírito Santo como Patrimônio Cultural Imaterial Nacional” (Patrimonialização do Congo do ES) foi criado através de uma parceria, via Termo de Execução Descentralizada, entre o IPHAN-ES e a Universidade Federal do Espírito Santo, com o apoio da FUCAM. Dá continuidade aos projetos “Saberes do Congo, saberes da Universidade”, da Prof.ª Elisa Ramalho Ortigão, e “O Congueiro”, do Prof. José Otavio Name, do Centro de Artes. Participam do projeto os bolsistas de pesquisa Felipe Mattar Ferraço, João Victor dos Santos, Daniel Zürcher e Matheus Giacomin Sian.
Publicado por ocongueiro.com Congo do Espírito Santo
Kommentare